Série Carreiras: Psicologia
Ano 3, n. 9, 2010Entrevistado: Marisa Lopes da Rocha
Data da entrevista: 07/01/2011
Professora adjunta do Departamento de Psicologia Social e Institucional do Instituto de Psicologia, pesquisadora no Programa de Pós-graduação em Psicologia Social e procientista da UERJ. Bolsista do CNPq, é mestre em Filosofia da Educação pelo IESAE/FGV e doutora em psicologia pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas da Subjetividade da PUC/SP.
Revista
do Vestibular: Grande parte das pessoas imagina que a atividade dos
psicólogos se limita a atendimentos em consultórios. Em que outras áreas
o psicólogo pode atuar?
Marisa: A
Psicologia tem como foco de estudo e de ação a produção de
subjetividade, isto quer dizer que, ao psicólogo, interessa iluminar
como nos constituímos em meio às relações, às tradições, às instituições
sociais e através de que práticas nos valemos para produzir um lugar no
mundo. Assim, valores, expectativas, ações, afetos e pensamentos são
alvo de nossas pesquisas. O psicólogo como profissional de saúde está
atento à cultura, às condições de existência, às circunstâncias de vida
que são as forças com as quais os homens constroem o mundo e
concomitantemente se constroem. Por saúde, podemos entender a capacidade
de, a cada momento, enfrentar imprevistos e dificuldades, usufruindo de
nossas habilidades para criar novas situações mais favoráveis à
expansão de nossas vidas nos diferentes sentidos. Isso significa que
buscar um contato com o psicólogo não quer dizer que estejamos doentes,
porém que queremos um espaço para pensar nossas escolhas, estratégias e
práticas, analisando o caminho que vimos produzindo. Onde encontrar o
psicólogo? Eles hoje estão nas escolas, nas empresas, nos consultórios,
nos presídios, nos asilos, nas varas de família, nos departamentos de
trânsito, nos órgãos de segurança pública, nos clubes esportivos, ou
seja, estão onde a vida pode ser pensada, reavaliada, transformada,
expandida individual ou coletivamente.
Revista
do Vestibular: A senhora é professora do Instituto de Psicologia da
UERJ e realiza pesquisas voltadas para o campo da educação. Fale um
pouco sobre sua experiência. O que a levou a essa profissão?
Marisa: Eu
me formei entre as primeiras turmas de Psicologia da Uerj na década de
1970 do século passado, e no meu tempo de aluna a universidade não tinha
ainda um Serviço de Psicologia Aplicada (SPA), local em que os alunos
realizam suas horas de estágio. Dessa forma, cumpríamos nossas horas de
prática profissional fora da Uerj. Por um lado, era uma luta conseguir
bons locais com supervisão e de pesquisas, por outro, nos obrigava desde
muito cedo a construir nossa formação, o que nos possibilitou
experimentar diferentes práticas profissionais, áreas de trabalho em
situações nem sempre fáceis, ampliando nossas escolhas. Entre os
diferentes campos nos quais estagiei, a educação foi o mais instigante e
talvez isso se deva ao fato de considerar que a escola tem como questão
junto com a família a de facultar à criança a noção de que o mundo
começou antes e ainda continuará após sua vida. Isso significa alongar o
tempo presente para que cada um possa construir um lugar ativo na
sociedade. Como não é uma tarefa fácil, gera tensões, conflitos,
exigindo atenção às relações. Venho até hoje trabalhando com
professores, jovens, crianças e psicólogos em formação para os desafios
das transformações das instituições educacionais, ou seja, dos valores,
dos usos do tempo e do espaço, da organização coletiva do trabalho.
Revista
do Vestibular: O Instituto de Psicologia da UERJ tem um longo histórico
de relacionamento com a comunidade através de suas clínicas. Qual a
importância dessa relação para as atividades de ensino, pesquisa e
extensão da faculdade? Que atendimentos o Instituto oferece?
Marisa: O
Serviço de Psicologia Aplicada (SPA) é um órgão ligado à direção do
Instituto, que conta com professores de psicologia e psicólogos de
diferentes formações para desenvolver estágio supervisionado com os
alunos através do atendimento à população. Lá contamos com profissionais
de linhas diversas de trabalho como psicanalítica, sistêmica,
comportamental, psicopedagógica, institucional, organizacional, que
pressupõem campos diferenciados de atuação (como visto antes), para
faixas etárias que vão da infância à terceira idade em âmbito de
práticas individuais, grupais, institucionais. Muitos estágios, entre
esses os vinculados a projetos de pesquisa ou de extensão, ocorrem no
interior das instalações da Uerj, outros se realizam fora da Uerj. Temos
ainda estágios que, embora não sejam supervisionados pelo corpo de
supervisores do SPA, são desenvolvidos em locais conveniados e validados
pelos profissionais do SPA (alguns destes foram conveniados pela
iniciativa de alunos).
Revista
do Vestibular: Quais as maiores dificuldades que o jovem graduado em
Psicologia vai enfrentar na vida profissional? E quais as maiores
alegrias?
Marisa: Eu
diria que as dificuldades começam na própria faculdade, durante o curso
de formação, em que o aluno precisa ter tempo e interesse em boa dose
de leitura. Considerando que a maior ferramenta de um psicólogo é ele
próprio, suas descobertas sobre seus modos de funcionar, dificuldades,
habilidades, seu conhecimento sobre tensões contemporâneas, questões
sociais, além dos saberes ligados à sua área de trabalho, que não para
de crescer e se diferenciar, são importantes. Quero dizer que não basta
dominar uma técnica, ela tem que compor um território com o outro e em
grande medida isso ocorre a partir das lutas de cada um pelo próprio
equilíbrio que não é estático, mas uma conquista permanente. Então, de
um psicólogo espera-se cultura, crítica, plasticidade, reflexão,
práticas de si. A partir dessas questões colocadas, muito das
possibilidades de um bom lugar profissional vai depender do que o
profissional tem a oferecer, já que a competição é grande. O mercado
privado oferece poucas vagas nos diversos setores, temos tido alguns
concursos públicos para a área de saúde, educação e justiça, mas todos
não muito bem remunerados, talvez nas empresas surjam possibilidades de
maiores salários. Os consultórios requerem prudência, pois implicam
muitos gastos e a clientela diminuiu muito com a crise econômica. Muitos
recém-formados têm preferido a carreira docente, ingressando nos
Programas de Pós-Graduação. Em relação às alegrias, acredito que está em
lutar por espaço de trabalho e ampliação de conhecimentos do que se
gosta, do que escolhemos como modo de expressão de nossos afetos,
pensamentos e ações.
Revista
do Vestibular: Gostaríamos que a senhora deixasse uma mensagem para os
candidatos do Vestibular Estadual que desejam cursar Psicologia.
Marisa: Deixo o que Eduardo Galeano, jornalista e escritor uruguaio, falou no III Fórum Social Mundial em Porto Alegre:
A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais o alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.
Isso significa: empenho, foco, dedicação para um processo que não está no início e que, mais do que uma carreira de psicólogo, é um desafio constante de invenção de vida que já está em curso.
Boa sorte e sejam bem-vindos!
A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais o alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.
Isso significa: empenho, foco, dedicação para um processo que não está no início e que, mais do que uma carreira de psicólogo, é um desafio constante de invenção de vida que já está em curso.
Boa sorte e sejam bem-vindos!
disponivel em: http://www.revista.vestibular.uerj.br/entrevista/entrevista.php?seq_entrevista=7