Data da entrevista: 10/04/2012
Alberto Franco de
Sá Santoro possui graduação em Física pela Universidade Federal do Rio
de Janeiro (1969) e doutorado em Física pela Université de Paris VII -
Université Denis Diderot (1977). Atualmente, é professor visitante da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro e bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq nível 1A.
Tem experiência na área de Física com ênfase em Reações Específicas e
Fenomenologia de Partículas, atuando principalmente nos seguintes temas:
charm, jets, top, particles e collisions.
Revista
do Vestibular: O senhor foi professor titular do Centro Brasileiro de
Pesquisas Físicas – CBPF e da Universidade do Estado do Rio do Janeiro –
UERJ. Atualmente, é professor visitante desta Universidade. Conte-nos
um pouco sobre sua escolha e trajetória profissional.
Alberto Santoro:
Obrigado pela oportunidade de falar sobre minha vida profissional. Antes
de entrar na profissão de Física, vendi pastel na rua para sobreviver,
fui datilógrafo de advogado, fui funcionário público trabalhando na
Seção de Fiscalização da Medicina, fui bancário. Estudando à noite me
formei em contabilidade. Fui para Itajubá para estudar engenharia e, um
ano depois, meu irmão Claudio foi para Brasília. Fui passar um mês com
ele e me apaixonei pelo ambiente no qual ele estava vivendo. Decidi
fazer vestibular para a Universidade de Brasília, isso por volta de
1961-1962. Passei para arquitetura, o curso que mais se aproximava de
Engenharia Eletrônica, que eu queria fazer. Quando o professor Roberto
Salmeron chegou à Universidade me convidou para fazer Física. Aceitei e
fui aluno especial. Esse período, confesso, foi um dos mais felizes de
minha vida. O golpe de estado em 1964 interrompeu meu curso, e fomos
todos para o Rio de Janeiro. Aqui entrei para a Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras que funcionava na avenida Antônio Carlos. Depois fui
para o CBPF fazer pós-graduação com o professor José Leite Lopes. Em
1968-1969, o clima no Brasil ficou irrespirável. Todos os meus
professores foram cassados; meus colegas, torturados e presos; outros
desapareceram. Ganhei uma bolsa para a França e fui para lá para fazer
meu doutorado, que retardei o máximo que pude para não ter de voltar
para a ditadura. Quando voltei, retornei para o CBPF, pois não
interrompi minha ligação com a Instituição, estava de licença na França.
Aqui, trabalhando em Física Teórica e Fenomenologia de Partículas,
apareceu um convite de Leon Lederman (Premio Nobel de Física) para ir
trabalhar em pesquisas experimentais no Fermi National Accelerator
Laboratory, próximo de Chicago. Participei de quatro experimentos lá, e,
em um deles, tive a sorte de acompanhar a descoberta do Quark Top. Eu
quis vir para a UERJ, pois havia formado alguns professores daqui, que
fizeram doutorado e mestrado comigo no CBPF, que é, por lei federal, uma
instituição de ensino e pesquisa. Aliás, é a primeira pós-graduação
brasileira em Física. Por força da lei, fiz 70 anos e fui obrigado a me
aposentar. Hoje, sou professor visitante na UERJ.
Revista
do Vestibular: Nos concursos vestibulares, Física é uma das disciplinas
em que os estudantes mostram mais dificuldade. Qual sua opinião sobre o
ensino de Física nas escolas brasileiras?
Alberto Santoro:
Eu acho que o problema não está só na Física. Tive alunos com tanta
dificuldade para escrever a tese de mestrado que me perguntava como
podiam ter chegado à pós-graduação. Sobre o ensino da Física,
considero-o muito dogmático. Deveria ser totalmente voltado para ensinar
a pensar, a raciocinar, e isso só é possível com bons laboratórios. Por
que os melhores alunos são de famílias com melhores condições
financeiras? Porque, em geral, tiveram uma formação melhor. O estudante
não aprende a estudar no ensino fundamental e leva para o ensino médio
suas deficiências, e depois para a Universidade. No vestibular, a área
da Física, em geral, apresenta questões para pensar, e aí surge a grande
barreira. Não se aprendeu a pensar. Não se aprendeu a fazer uma prova, a
resolver um problema. E, no entanto, o grande sucesso profissional da
Física está no fato de que o curso de Física obriga você a estar
constantemente desafiado a resolver problemas. É com isso que eu me
preocupo: a problemática de ensinar a pensar!
Revista
do Vestibular: O senhor desenvolve pesquisas especialmente voltadas
para a Física de Altas Energias Experimental. Qual a abrangência desse
campo de estudos e qual tem sido o papel do Brasil no campo da Física de
modo geral?
Alberto Santoro:
Nós podemos dizer que a Física de Altas Energias Experimental é por si
só multidisciplinar. Envolve Mecânica, Eletrônica, Fotônica, Computação e
muitas outras categorias. Foi no Conseil Européen pour la Recherche
Nucléaire – CERN que foi criada a World Wide Web, por Tim Bernes Lee.
De lá saem muitas tecnologias empregadas na medicina, como o tratamento
do câncer por feixe de partículas, com muitas vantagens diante de outros
tratamentos. A tecnologia avançada de vácuo é outro exemplo: seu mais
recente emprego será feito nas placas de captação de energia solar que
vão cobrir todo o aeroporto de Genebra. Mas nessa área, sobretudo,
aprendemos que a natureza, com suas leis fundamentais e seus tijolos,
constitui uma grande fonte de curiosidades. Por incrível que pareça, o
Brasil praticamente começou com a Física de Altas Energias e talvez por
essa razão tenha uma participação importante nos Experimentos de Altas
Energias, em particular, no CERN.
Revista
do Vestibular: Quais as maiores dificuldades que o jovem graduado em
Física vai enfrentar na vida profissional? E quais as maiores alegrias?
Alberto Santoro:
As dificuldades são as mesmas que aparecem para o jovem em qualquer
profissão. O mundo novo que se apresenta, o exercício da pesquisa com
todo o rigor exigido. Mas, quando se tem prazer no que se está fazendo,
todas as dificuldades ficam muito pequenas e desprezíveis diante do
prazer da descoberta. Obrigatoriamente, você trabalha com muitas
nacionalidades e, portanto, muitas diferentes culturas, e isto é
extremamente enriquecedor. A fórmula do sucesso é uma só: trabalho e
trabalho e trabalho.
Revista
do Vestibular: Gostaríamos que o senhor deixasse uma mensagem para os
candidatos do Vestibular Estadual que desejam cursar Física.
Alberto Santoro:
Física é uma das fontes mais sofisticadas de prazer. Isto porque é o
prazer intelectual. Ela abre e oferece muitas oportunidades para você
trabalhar. Mas o mais importante é você insistir naquilo que você mais
deseja para sua vida. Quando se tem prazer no que se faz, toda
dificuldade torna-se pequena.
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